Arthur Dias
Softwares estão devorando o mundo. Essa frase foi dita em 2011 por Marc Andreessen. Ele foi criador de um dos primeiros navegadores da internet, o Netscape. Essa frase profética se referia a um simples fato: as empresas se concentrariam cada vez mais em desenvolver softwares como forma de gerar valor, causando disrupção em setores tradicionais.
Não haveria de ser diferente no setor da saúde. Por um lado, temos softwares que acompanham dispositivos inteligentes. Temos balanças, glicosímetros e outros medidores que se conectam a celulares, tablets ou computadores. Eles registram a medição e criam gráficos, alertas e monitoram tendências. Do outro lado, temos o que é classificado pela FDA como Software as a Medical Device (SaMD). É o caso de softwares com fins médicos, mas que não dependem de nenhum hardware. Podemos pensar em softwares de diagnóstico ou planejamento de tratamento. Outro exemplo seria o de aplicativos que ajudam pacientes a fazer automonitoramento de seu quadro.
Sendo assim, é fato que a tradução da área da saúde (como a de outras áreas também) cada vez mais terá que conhecer alguns termos de TI. Separei aqui alguns exemplos que são essenciais e podem aparecer na tradução de materiais relacionados a dispositivos, softwares e estudos. Esse artigo não é nem de longe abrangente. O objetivo é só apresentar alguns conceitos essenciais.
1 – HealthTech
O termo HealthTech é resultante da aglutinação das palavras Health e Technology. Grosso modo, o termo se aplica a empresas de tecnologia (geralmente startups) que desenvolvem soluções para a área da saúde. A palavra abrange desde startups que desenvolvem softwares de telemedicina ou prontuários eletrônicos a operadores de saúde que usam a tecnologia para apoiar a criação de planos de saúde.
Essa aglutinação é bastante comum e não é exclusiva da área da saúde. Termos semelhantes são usados para designar startups de outras áreas: AgTech (agricultura), FinTech (setor financeiro e bancário), EdTech (educação).
2 – API
API é a Application Programming Interface, ou interface de programação de aplicações. Aí você pode me perguntar: ok, mas o que significa isso? A API nada mais é do que um software intermediário conectando duas aplicações. Pense nela como uma ponte, ou melhor ainda, como um serviço de entregas. O software A tem um conjunto de informações. O software B precisa de tais informações em um formato específico. Por meio da API, o software B faz a solicitação e recebe do software A no formato correto.
Na área da saúde, APIs são muito usadas para garantir a interoperabilidade. A API serve para que os dados de uma fonte (como um hospital) possam ser usados por outros profissionais ou instituições. Além disso, uma API pode garantir que só os dados necessários serão enviados. Isso evita a exposição de dados confidenciais.
3 – Internet of Things (IoT)
Estima-se que atualmente 4,6 bilhões de pessoas, ou 65,6% da população mundial, estejam conectadas à internet. Por outro lado, temos cerca de 45 bilhões de dispositivos conectados à internet. Ou seja, dez dispositivos por pessoa. Isso é que se chama de Internet das Coisas (IoT). É a rede formada por todos os dispositivos conectados à internet e com a capacidade de acumular dados e transmiti-los. Basta pensar no celular que está ao seu lado com o GPS ativado, seu smartwatch que sabe quantos passos você deu e sua TV que sabe o que você está maratonando na Netflix.
Na área da saúde, a IoT pode ser aplicada ao monitoramento remoto de pacientes, tanto hospitalizados quanto ambulatoriais. É possível também controlar bombas de infusão, por exemplo, ou outros dispositivos. Os dados acumulados pelo monitoramento podem ser usados para detectar padrões e tendências. Assim, pode-se prever e evitar complicações e até reduzir erros humanos.
A aplicação específica na área de saúde e medicina tem até seu próprio nome: MIoT, Medical Internet of Things.
4 – Big Data
Começando da definição básica: dados são conjuntos de variáveis qualitativas ou quantitativas. Estes podem ser estruturados ou não, passíveis de leitura por máquina, digitais ou analógicos, pessoais ou não. Big Data refere-se a grandes conjuntos de dados, com três propriedades definidoras: Velocidade, Volume e Variedade (3 Vs). Segundo a consultoria Gartner, são “dados com maior variedade que chegam em volumes crescentes e com velocidade cada vez maior”. Isso impede o uso de métodos e ferramentas tradicionais de análise de dados.
Na área da saúde, há diferentes aplicações para Big Data. Pode-se utilizar, por exemplo, para programas estratificação de risco de planos de saúde. Pontuações de risco são criadas com base em critérios determinados analisando uma imensa quantidade de dados de pacientes com as mesmas características.
Outra possibilidade de uso é na avaliação de instituições de saúde. Com o uso de grandes quantidades de dados anonimizados, pode-se verificar a qualidade dos cuidados prestados por uma determinada instituição. Big Data também possibilita metanálises usando grandes conjuntos de dados do mundo real, o que pode ser bastante útil para farmacovigilância e monitoramento pós-comercialização.
5 – Software as a Service (SasS)
O modelo de Software as a Service, ou Software como serviço, é a evolução dos softwares devorando o mundo. Muitos de nós já abandonaram a boa e velha licença de versão anual do pacote Office pela licença anual (ou com algum outro prazo) do Office 365. Nossas amigas CATs também têm suas versões de SaaS: memoQ cloud, Memsource, Smartcat.
O modelo as a Service se expandiu tanto que podemos falar também em Infrastructure as a Service e Platform as a Service, e atingiu o ápice com o que se chama de Anything as a Service, ou XaaS. Esses serviços incluem não só o software, mas também poder computacional, armazenamento, rede, segurança e tudo que é necessário para operar uma solução.
Na área da saúde, o modelo de SaaS/XaaS também é cada vez mais utilizado. Ele pode ser usado em sistemas de informações clínicas, armazenamento e processamento de imagens e exames, plataformas de telessaúde e portais de contato com pacientes. A possibilidade de armazenar e processar dados na nuvem pode reduzir custos para instituições de saúde, eliminar a necessidade de investimentos em infraestrutura e possibilitar a conexão com outros profissionais e instituições.
Pergunta bônus: como vocês acham que os sistemas do hospital se comunicam com sistemas terceirizados de um modelo de SasS/XaaS? Por meio das APIs, que cuidam da solicitação e do envio de dados!
TI já é parte de qualquer área
Não há como fugir. A tecnologia já está incorporada em todas as áreas da nossa vida. Então mesmo que sua especialização como profissional de tradução seja em saúde, será cada vez mais necessário conhecer alguma coisa da área de tecnologia. Além dos termos mencionados acima, sugiro uma visita ao glossário do site Talking HealthTech (https://www.talkinghealthtech.com/glossary) para conhecer e pesquisar mais sobre o assunto ou este artigo da revista CIO (https://www.cio.com/article/2985044/health-it-glossary.html). E insisto que sigam aprendendo e se informando sobre a área. Os softwares podem estar devorando o mundo, mas a tecnologia não precisa nos devorar também!
Intérprete de conferências e tradutor nos idiomas português (A), inglês (B) e espanhol (C), Arthur Dias fez sua formação na Brasillis Idiomas e se tornou bacharel em tradução e interpretação pela Uninove. Adicionalmente, participou de cursos avançados de interpretação de conferências, como HiTT, EPICourse, EPICMed e BoothCamp. Atuando na profissão desde 2011, especializou-se nas áreas da saúde, farmacêutica, medicina, tecnologia, inovação e comunicação. Ao longo dos anos, participou de conferências, congressos, viagens nacionais, missões internacionais, auditorias e negociações.